Senhor Odair,
Conforme conversamos no funeral do senhor seu pai, envio-lhe a carta com as últimas palavras do pobre homem. Algumas semanas antes de morrer, o Sr. Honório confiou à direção da clínica esta carta, pedindo que somente fosse entregue ao senhor (e ao seu irmão Cosmo) após sua morte. Expressando nossos profundos pêsames novamente, desejamos que a paz possa reconfortar seus feridos corações.
Atenciosamente,
Matheus Criandello,
Diretor da Casa de Repouso Feliz Regresso.
Holambra, 2 de novembro de 2006
Casa de Repouso Feliz Regresso
Aos meus filhos Odair e Cosmo
Queridos filhos, escrevo-lhes mais uma vez, quem sabe a última, pois por muito tempo acalentei em minh’alma a esperança de que seus corações fossem tocados e de que vocês viessem finalmente me visitar. Todas as noites, durante esses 15 anos em que já estou aqui, pedi a Deus para que colocasse o perdão nos espíritos de meus amados filhos, e para que os fizesse ver que todo ser humano tem o direito de errar e de se retratar, de reconhecer o erro, a culpa, por mais que possa ter ferido os sentimentos e os corpos daqueles a quem um dia amou. Orei durante esses longos 15 anos para que vocês me perdoassem um dia, para que vissem que eu estava fora de mim naquela maldita tarde quente, para que entendessem que eu estava tomado por algo que não era eu. Rezei todas as tardes para receber a visita alegre de um de vocês, ou quem sabe de minhas noras e netos. Mas a solidão tem sido minha única companheira nesses anos todos.
A solidão e minha fértil imaginação. Passei dias e dias imaginando como vocês estariam vivendo, como estariam gastando a minha fortuna, enquanto eu estava aqui encarcerado nesta clínica, neste asilo, neste inferno. Imaginando suas esposas batendo carros comprados com meu dinheiro, seus filhos estudando em escolas caríssimas pagas com meu dinheiro, vocês mesmos esbanjando meu dinheiro em uma vida social que me foi negada, já que estou aqui, preso. Imaginei também a ânsia de vocês por ver-me morto, para finalmente poderem colocar as mãos em toda a minha fortuna, e não somente na pequena parte que lhes cabe durante o tempo em que eu estiver vivo. Acalentei até muito pouco tempo atrás o sonho de vê-los entrando por esse gramado, felizes, de mãos dadas, dizendo que me perdoavam e que me levariam de volta à vida. Mas nada disso aconteceu.
Minto quando digo que a solidão tem sido minha única companhia. Houve também uma nova companheira, que chegou com força total nesse último ano de minha vida. Ela é bonita, e tem um vigor fenomenal, apesar de ser um pouco fria. Seu nome é Vingança. Dizem que se deve comê-la fria. Quando estiverem lendo esta carta, meu corpo já estará frio, e minha Vingança estará pronta para ser saboreada por mim, onde quer que eu esteja.
Mas vamos logo ao que interessa: MEU TESTAMENTO. Não é somente isso que vocês esperam? Imagino até que tenham pulado os parágrafos anteriores, na esperança de finalmente saber quem leva meu rico dinheirinho. Pois bem, seu bando de filhos da puta: vocês vão ter de penar um bocado até chegar a ele. Tempo não me faltou aqui (nem tampouco motivação) para criar uma bela de uma caça ao tesouro, digna de filmes que as putas das suas esposas devem adorar ver, nos motéis em que os chifram com seus amantes que devem ter paus muito maiores e mais potentes que os seus, uma vez que nenhum de vocês puxou a mim no quesito dote. Se vocês quiserem colocar as mãos na grana, vão ter que comer o pão que o diabo amassou e recheou com merda mole e sangrenta.
Nesta carta, vocês receberão a primeira pista para a caça ao tesouro que preparei para vocês, seus bostas. Cada pista levará a outra, espalhada pelo mundo real com a ajuda de empregados da clínica, devidamente pagos. Vocês passarão por tarefas humilhantes, por lugares imundos como a cara de vocês, até chegarem à minha herança. Porcos que são, tenho certeza de que não se negarão a nada para ter acesso ao dinheiro. Minha dúvida é só uma: terão vocês cérebro para decifrar as pistas? Veremos, meus caros, veremos...
A primeira pista vai agora. Preparados, seus veadinhos? Vamos lá:
Do caralho pinga pôrra
Da buceta pinga mel
Das vacas pinga leite
Das flores pinga o mel
Essas moças sabem disso
Sabem disso e muito mais
Encontrem-nas na terra do pau grande
E a próxima pista pode lhes trazer paz
Gostaram, seus animais? Honrem meu nome e meu sangue e ponham a cabeça pra funcionar. Peçam ajuda pras biscates que vocês desposaram. Elas entendem do negócio como ninguém, e podem até mesmo conhecer algumas das moças que citei.
Mas estou me alongando. Adeus, seus pulhas. Daqui do inferno vos contemplo.
Com amor,
seu pai,
Honório Nascimento Villas Boas.
segunda-feira, 12 de outubro de 2009
Folhetim Vagabundo – História II – Capítulo I – O fim e o início
Para ler ouvindo isso: http://www.youtube.com/watch?v=tXXHYX7zk1c
Acompanhe o segundo capítulo dessa história amanhã, terça-feira, no blog da Tatiana Rocha, aqui, ó!
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2 comentários:
Jupa, arrasou! Que belo começo, companheira. Agora teremos de nos virar nos 30 para honrar sua criatividade.
PS. Aposto que vc já tem a caça ao tesouro completa na sua cabeça, sua freak!ahahahaha
hahahaha concordo com a Luli, Jupinha adorei seu texto, estou louca para saber se o desenrolar dele esta compativel com as pistas e recompensas que vc tem em seu mente rsrsrsrs
bjocas amiga!!!
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