segunda-feira, 29 de junho de 2009

Boleira

Era uma vez um atacante e um goleiro.

Pra vocês que não entendem de futebol, deixem-me explicar como são os atacantes e os goleiros em geral.

O atacante é a estrela do time: é aquele que dá milhares de entrevistas, as empresas pagam fortunas para ele usar a chuteira tal e a marca xis, as mulheres todas querem dar pra ele, ele protagoniza escândalos e romances, está sempre nas capas das revistas e na boca do povo. Dedica gols pros seus filhos, mulheres, pra Deus.

O goleiro é menos conhecido. Pouquíssimas vezes é o personagem principal do time. Fica ali na dele, defendendo a área que lhe foi designada. A não ser que seja o goleirão da seleção, ninguém sabe o nome dele (somente os torcedores fanáticos mesmo). Só dá entrevista se fizer cagada, engolir vários frangos. Se fizer o seu papel, defender milhares de gols e tomar uns dois, ninguém vai nem se abalar.

O atacante tem por função marcar gol. Como o nome diz, ele ataca. Parte pra cima. Corre na frente. Dribla um monte e tenta chegar ao gol, vencendo vários jogadores no caminho e derrotando o goleiro, de preferência com um golaço, que é pra humilhar mesmo.

O goleiro tem por função defender. O nome em inglês é “goal keeper”, ou seja, ele é uma espécie de guardião, de protetor, o grande defensor. Fica ali na dele, sem grandes correrias, esperando o negócio feder pro seu lado, pra daí entrar em ação, humilhando o atacante quando frustra sua tentativa de golaço.

Tem até goleiros com alma de atacante (taí Rogério Ceni, que não me deixa mentir): não conseguem ficar quietinhos no canto deles, têm que sair correndo pra fazer gol, pra dar entrevista, pra ser estrela. Atacante com alma de goleiro é um negócio mais raro e complicado (esse é mesmo pra casar!).

O atacante tem que olhar pra bola. Mas, muito mais do que isso, tem que olhar pro campo todo, pra todos os jogadores, ver onde os adversários estão e tentar adivinhar seus movimentos futuros, ver os jogadores do seu próprio time e pensar nas jogadas certas. Se fica só olhando pra bola, vai se ferrar, vai se foder de tanto levar falta, vai acabar quase sempre impedido, vai ser fominha e egoísta. É preciso ter muita inteligência, estratégia e domínio para ser um atacante.

O goleiro tem que olhar pro campo todo. Mas, muito mais do que isso, tem que olhar pra bola. Porque, se ele se distrai com o movimento geral do jogo, a gorduchinha entra e ele nem vê. Ele tem que acompanhá-la com os olhos o tempo todo, prestar atenção aonde ela vai, de onde ela vem, estabelecer uma comunicação com ela, entender sua linguagem. É preciso ter muita inteligência, estratégia e domínio para ser um goleiro.


Homens são todos jogadores de futebol. Tem pra todas as funções: homem lateral, homem zagueirão, homem centroavante. E, claro, tem os atacantes e os goleiros.

Tudo o que uma mulher quer na vida é um goleiro. Que vai proteger, defender a sua área, ficar ligado no perigo que vem e impedi-lo. Que vai olhar para a bola o tempo todo, ser o herói silencioso e sem os louros da fama. O protetor, em quem se pode confiar. Aquele que defende seu território com unhas de ferro e luvas de couro e borracha. Aquele que, quando menos se espera, salta do nada e segura o que é seu. Que cai no chão e se machuca, que leva chute na cabeça, pra mulher cuidar depois em retribuição.

Mas toda mulher fica doida com um atacante. Que ginga, dribla e marca. Que corre, olha e chuta com potência. Que está debaixo de todos os refletores, que fala com a imprensa, que todos olham e sabem quem é e querem tirar uma lasca. Que tem um monte de mulheres, e por isso mesmo cada uma tem a vontade e a ilusão de ser a única. Que sofre falta, mas também comete. Que bate boca com o juiz e leva cartão, todo macho. E depois dá entrevista putinho, cheio de estilo.

A mulherada sonha com os goleiros, se fode (e fode) com os atacantes. Quer um goleiro, no fundo no fundo, mas não pode ver um atacante que algo mexe lá dentro. Toda mulher já se ferrou de verde e amarelo com um atacante. E já desejou ter um goleiro pra chamar de seu.

Era uma vez um goleiro e um atacante.

Você vai pensar com a mente ou com os sucos vaginais? Com o coração ou com a vaidade? Com a diversão ou com a verdade? Que o atacante pode ter alma de goleiro, isso até pode, mas é a coisa mais rara do mundo. Ele vai jogar em muitos times, mudar de contrato milhares de vezes, até um dia decidir se aposentar e jogar no gol nos campinhos de várzea. E então pode ser o melhor goleiro de todos os tempos do society. E os goleiros com alma de atacante? Que também curtem dar sua corridinha, que batem um tiro de meta “jesus-me-abane-que-potência”, que podem ser estrelas se quiserem, mas não querem. Mas podem. E você sabe que eles podem.

Era uma vez um atacante e um goleiro.

Riscos se correm com todos os tipos de jogadores. Com alguns menos, com outros mais. O atacante pode deixar a marca de sua chuteira em você, te passando um carrinho ou te dando um belo pé na bunda quando menos se espera. O goleiro pode deixar a marca de suas luvas em você, te dando um tapa na cara ou te sufocando a garganta tentando impedir um gol.

E aí, vai encarar?



EPÍLOGO:

Meu pai é árbitro de futebol. Cartão vermelho pro atacante, cartão vermelho pro goleiro. Eu vivo cercada pelos jogadores de vôlei... e pelas jogadoras de basquete. A minha vida inteira quis um goleiro e me ferrei. A minha vida inteira fui apaixonada por atacantes e me ferrei. Acho que não sei mais o que é o ideal. Na verdade, sei: o ideal não existe, né? Mas a verdade é que eu cansei de jogar squash. Quero mesmo é um parceiro que venha detonar comigo no tênis de mesa.

Um comentário:

Tatiana disse...

Que tal um jogador de bocha?