Eu tô tão surtada que eu acendi um cigarro, deixei no
cinzeiro e acendi outro, sem perceber. Eu tentei parar em duas farmácias pra
comprar a merda da pílula e não consegui, uma porque não tinha lugar pra parar,
a outra porque tinha uma fila gigantesca e os dois atendentes estavam no
telefone. Saí cantando pneu e chorando, e foi aí que eu percebi que eu não
estou bem.
Quando eu cheguei na terceira farmácia e o mocinho bonito me
perguntou se tava tudo bem, eu tive vontade de pular no colo dele e ficar
chorando até amanhã. Daí eu tive dó de mim mesma porque eu não tenho colo pra
chorar. Literalmente. Porque o “tudo bem?” dele e a cara de preocupado foi tão
diferente do “tudo bem?” das pessoas do dia a dia, aquelas pra quem você
responde “tudo”, mesmo sem estar tudo bem. E porque eu sou essa pedra que não
abraça as pessoas, que não beija as pessoas de verdade, que não se permite um
carinho, um contato físico mais demorado, só com namorados, e eu perdi a conta
de quantos séculos faz que eu não tenho um namorado. Eu nunca fui essa pessoa
de abraçar amigos, de ficar de mão dada com amigas, de ficar deitada no colo de
pai e mãe. Mas hoje eu só queria que tivesse alguém me esperando em casa e que
soubesse que não, não está tudo bem, e já faz tempo, mas é que eu sou essa
pedra, eu vou no moto-contínuo, eu sorrio, faço graça, faço piada, eu sigo em
frente e faço a forte, mas eu não sou feita de pedra, caralho, eu sou manteiga
às vezes. É raro, mas eu sou. E eu tenho vergonha de precisar das pessoas pra
essas coisas, eu me sinto desconfortável quando pegam na minha mão por mais do
que 30 segundos, solto antes de medo da pessoa soltar antes, saio do abraço
logo antes que a pessoa saia. Mas hoje eu queria que me olhassem e percebessem
que eu preciso de um banho quente, de uns dois cigarros (um de cada vez, por
favor) e de colo. Colo físico, colo literal. De que mexessem no meu cabelo sem
que eu tenha que ficar preocupada se está embaraçado ou se os cachos estão
estranhos, eu que nem gosto de cafuné, mas é porque eu sempre fico pensando se
tem algo estranho com o meu cabelo e a pessoa vai notar, então fico sem. Eu
fico sem muitas coisas por pensar demais. Mas daí, quando eu faço uma tentativa
de entrega, sutil, daquele meu jeito, e não recebo uma resposta, e recebo o
silêncio, daí eu me fecho ainda mais.
E então eu tô aqui em crise, mas amanhã é outro dia pra eu
colocar um sorriso na cara e fingir que tá tudo bem, e responder “tudo bem” pra
quem pergunta mas não quer mesmo saber.
Eu vou lá dormir com os meus 5
travesseiros. Eu dou risada de ter tantos, as pessoas dão risada, mas eles
enchem a minha cama, limitam meu espaço, ficam comigo a noite toda e eu não
preciso pensar se estou agradando. Eles não perguntam se eu estou bem, mas eu
não preciso sair do abraço deles antes, porque eles nunca saem primeiro do que
eu.